domingo, 16 de janeiro de 2011

Marina.

    


    Marina jamais permitiu que um homem puxasse para ela uma cadeira ou cedesse um acento no ônibus. Pensava que se de fato um homem quisesse  ser gentil com uma mulher, ele deveria lavar seus próprios pratos e cuecas. De resto, enquanto tivesse pernas fortes para ficar de pé e força nos braços para puxar sua cadeira, ela mesma o faria.Marina achava também  que se ela quisesse pintar o seu rosto ou não era problema dela e não de Caymmi. Ele não tinha nada a ver com isso.
    Sonhava casar com um lindo vestido branco em uma igreja linda e ter dois filhos de sangue. O terceiro filho seria adotivo. Queria uma família grande.Leu certa vez em uma matéria que  no Brasil havia mais  famílias procurando crianças órfãs para adotar do que crianças para serem adotadas. O problema é que essas famílias definiam características das crianças como cor e idade . Isso ela não entendia. O que ela tinha era amor no peito e se sentia capaz de dá-lo para um negro, para um branco, para um pardo, para um amarelo, para um vermelho de bolinhas azuis, para um deficiente físico ou mental. Da idade que fosse, não importava. Se todos pensassem como ela, tinha certeza que não seria necessário esperar meses nas filas de adoção. É... até quando os seres humanos querem ser bonzinhos,eles conseguem ser mesquinhos.
  Nas horas vagas, no silêncio do seu quarto, geralmente tarde da noite, costumava masturbar-se. Nas suas fantasias poderia voltar no tempo e transar com John Travolta  no auge da sua beleza física, envolver-se nos braços de  Hugh Jackman e terminar na cama com a Modonna -she makes her feel like she was touched for the first time. E tudo isso na mesma noite. Ela tentava conversar sobre masturbação com as outras garotas, mas eram demasiadamente conservadoras. Achavam sujo, pecado. Marina acreditava que não havia nada de errado em conhecer o próprio corpo e proporcionar a si mesma prazer. Além disso, quando fosse transar com um rapaz, entenderia muito melhor como usar o corpo. Pecado é não ser feliz, dizia Marina. Essa vida é curta demais para nos podarmos dos prazeres da carne.
  Se pudesse gritaria para todas as mulheres se masturbarem, nunca esperou que um homem a satisfizesse. Ela própria o faria, por mais que tivesse que usá-los. O que seriam os homens se não meros objetos sexuais, não é mesmo?
   Definitivamente Marina não era como as outras garotas...
  

terça-feira, 11 de janeiro de 2011

Sobre o que não somos mais.

           De repente já não éramos mais  a mesma coisa. Aquele entusiasmo que sentíamos uma pela outra perdeu-se. No intervalo entre uma despedida e outra,  deixamos de ser essenciais para nos tornarmos dispensáveis. Como? Quando? Eu não sei. Você também não sabe.
           Poderíamos culpar a distância. Tomamos rumos distintos, você foi apreciar paisagens diferentes das minhas. Agora você cheira a campos floridos. Eu cheiro a descarga  de fumaça de carro.Você vê o sol entre as colinas. Eu vejo o sol entre prédios altos. Mas... na distância? Culpá-la? será? Eu te ligava, você me atendia. Um dia eu parei de te ligar e você parou de atender. Sempre atendeu, nunca ligou. Qual seria o sabor de atender uma ligação sua?
          Okay, vamos tentar colocar a culpa na tarifa sobre as ligações. Tudo bem assim? Não, não. Internet é muito barata.
        A questão é: Estamos felizes?
        Muito mudou depois de deixarmos de ser as mesmas, não sei se por isso ou por aquilo ou porque era inevitável. Nem tudo precisa ter uma causa. Só sei que as pessoas vivem dizendo por aí que eu mudei. Não consigo ver isso de forma positiva.Odeio mudanças,elas me causam medo. Dizer que não sou mais aquele é com dizer que perdi minha essência. Fico me indagando quem eu me tornei. Quem é esse novo eu? Melhor  ou pior que o de outrora?
        Você mudou.  Não alisas mais os cabelos. Agora gosta deles cheios, naturais. Resolveu assumir suas raízes negras. Estou te aplaudindo de pé por isso. Os meus cabelos você nunca deixou alisar.
      Você sempre gostou dos homens-com-beleza-diferente. Lembra? Apelidamos eles assim. Agora você está com ele. Agora é você e ele. Você e eu morreu. Foi-se e é como se nunca tivesse existido.
  Prometemos nos casar caso nenhuma de nós duas arranjasse marido. Nos prometemos isso porque eu tinha medo de envelhecer sem alguém ao meu lado. Você juntou os seus trapinhos e eu fiquei só. Você não se deu conta disso.
     Se eu estou feliz? Eu estou bem,obrigada. A felicidade está aí em qualquer lugar e se não houver motivos para sorrir a gente inventa. Consigo ser  feliz sem você, mas finais nunca deixam de ser tristes. D e alguma forma gostaria de ter dado adeus ao que éramos pois quando nos conscientizamos disso já era tarde demais para qualquer coisa.
    Não lutamos uma pela outra. Já não era mas valida essa briga?
    As vezes penso que merecíamos um final mais trágico, mais digno. Um The End que explicasse o porque desse fim.Talvez se tivéssemos brigado pelo mesmo homem ou pela mesma mulher. Talvez se você me visse na cama com o seu homem.Talvez se eu tivesse traído sua confiança, roubado seu emprego, ou rasgado sem querer aquele seu vestido favorito.Foi o fim pelo fim.
Uma nova amiga minha me disse algo que nunca vou esquecer: Ninguém é obrigado a ser amigo de ninguém. Não pense que é fazer pouco caso, amiga. É a realidade. Mas aprendi muito com o tempo em que vivemos juntas, incluindo essa última: Nada dura para sempre.