segunda-feira, 30 de maio de 2011

Tv Record contra o Kit de combate a homofobia.



  A premissa básico do jornalismo moderno é a objetividade e imparcialidade. É o que há de mais elementar no momento de se produzir uma notícia. O novo jornalismo (penny  press) veio fornecer informação e não propaganda.Veio separar os fatos das opiniões. As idéias e conceitos desse novo jornalismo podem ser resumidas na frase desse correspondente em Washington da agência noticiosa Associatad Press:"O meu trabalho é comunicar fatos: as minhas instruções não permitem qualquer tipo de comentários sobre os fatos, sejam eles quais forem" (Nelson Traquina. Teorias do Jornalismo Volume I). Não que um jornal não possa emitir opiniões.Pode desde que elas sejam devidamente identificadas como material opinativo. É para isso que existem as crônicas, as charges, os artigos e o editorial. Mas é inadmissível que um jornal tente vender uma matéria jornalística para o cidadão ,fantasiada de notícia isenta de parcialidade. Isso é manipulação.

 Esse é o caso da Tv Record, que nas últimas semanas veiculou em seus programas jornalísticos notícias e reportagens sobre o Kit de Combate a Homofobia, produto que faz parte do programa Escola sem Homofobia, com uma clara tentativa de manipulação. Nessas notícias e reportagens, que chegaram até a se estender por 12 minutos, só foram  exibidas pela equipe ja da Tv Record opiniões contrárias ao Kit formuladas por diversos setores da sociedade, inclusive de representantes da comunidade LGBTT. Mas para um jornalismo justo e de qualidade sabemos que dentro de uma notícia/reportagem deve haver espaço para se tratar aspectos tanto negativos quanto positivos sobre  o assunto abordado, já que existem opiniões distintas a respeito do tema.Outros setores da sociedade que tem opinião contrário a que foi trabalhada  deveriam ter tido direito a voz. Só dessa forma poderíamos estimular à sociedade um debate público enriquecido e não levar um direcionamento a forma de pensamento da população . No entanto, está claro que essa não é a intenção da Record. A empresa não desejava enriquecer o debate público e sim empobrecê-lo, induzindo o público a partilhar da linha editorial do  canal.Uma empresa de  grande porte e com profissionais tão competentes não comete erros tão primários.Esse pecado jornalistico não foi cometido por engano, eles estavam agindo de má fé.

  A Record foi o canal de televisão que cresceu insinuando que estava aqui para combater a hegemonia da Globo e que tinha como proposta ser diferente dela. E o que seria esse "diferente"? A Record julga a Globo como manipuladora. Não é isso o que ela estaria sendo agora? Manipuladora? Mas engana-se quem acha que essa é a única semelhança que se pode identificar entre Globo e Record. A última vem tentando imitar o padrão de televisão estabelecido pela primeira copiando seus programas e novelas ( isso é bastante óbvio).A Record não tem real intenção de ser um diferencial, como a Globo ela se entende como empresa de comunicação e está interessada única e exclusivamente em lucro, pouco se importando com a qualidade do conteúdo da televisão que produz.É lamentável. E muitos se deixam enganar pelo lobo em pele de cordeiro que é a Record. Ledo engano, caro telespectador. No final são todas farinha do mesmo saco. No fim a Record é apenas um reflexo embaçado da Tv Globo.

 Quem perde  com isso é o jornalismo que tem a sua imagem manchada por mais um canal de tv irresponsável e o cidadão que recebe diariamente esse lixo dentro de sua casa. Muito mais digno seria se a Record se posicionasse abertamente sobre os assuntos com os quais não concorda. Existem  gêneros jornalísticos apropriados para isso. Dica:Editorial. Não sabe o que é o editorial, Record? Editorial:  gênero que expressa a opinião institucional e apócrifa (sem assinatura individual) do jornal. Trata-se de um gênero jornalístico que expressa a opinião oficial do jornal em relação aos fatos mais relevantes no momento.

segunda-feira, 2 de maio de 2011

Por favor, não morra.


Sobre a mesa da cozinha havia apenas uma toalha de mesa rendada na cor branca , café preto e bolachas. Logo adiante, na sala, estava depositado o caixão no meio do cômodo. Sobre a mesinha de centro que reajustaram junto a porta,improvisaram um altar para a Nossa Senhora das Graças, onde colocaram velas acesas ao seu redor. As beatas de pé, vestidas de preto, entoavam cantos de adoração a Deus, que mais soavam como canções de despedida.

Aos poucos ele foi se aproximando. O caixão estava aberto, sua mãe estava coberta apenas por uma manta transparente. Ao se aproximar e vê-la estendida naquela caixa de madeira não diria que estava morta se já não o soubesse. Diria que estava dormindo. Parecia até conservar um leve sorriso em seus lábios. Lembrou como ela também parecia sorrir quando estava brava. Ela gritava, mas seus lábios pareciam desenhar um leve sorriso de canto de boca, difícil saber se estava brava ou se fingia estar apenas para não perder a autoridade e o peso de suas palavras. De súbito essas graciosas lembranças esfumaçaram e ele voltou para a realidade: Sua mãe estava morta.

Com as mãos trêmulas puxou o manta transparante descobrindo o rosto dela. Acariciou-o levemente com as costas de sua mão. Sua face estava tão fria, destoando de suas lágrimas que escorriam tão quentes , tão cheias de vida. Deixou que algumas gotas caíssem em seu rosto para quem sabe enche-lo um pouco de vida e de cor. Esperou alguns segundos, mas ela não abriu os olhos. Pediu a Deus por um milagre, esperou mais um pouco. Os olhos dela continuavam fechados e suas lágrimas continuavam caindo. Lentamente recobriu o seu rosto com o manto e sussurrou:

- Mãe, eu te amo.

Suas palavras o paralisaram e o chicotearam. Sabia que não havia proferido essas palavras a ela enquanto estava viva.Por vergonha ou displicência não havia dado a ela tantos carinhos quanto ela merecia.Agora, parado em frente ao seu corpo inanimado, incapaz de ouvir, ver e sentir, surgiu a necessidade de dizer tanto a ela, tantas coisas que já pensou em dizer, mas não disse. Gostaria de ter entregado a ela as flores que catou no campo, mas que havia jogado na porta da casa por achar a atitude tola. Sentiu que não deveria tê-la censurado de beijá-lo na frente da turma ou de pegar na sua mão ao atravessar a rua ainda quando era pequeno. Devia ter deixado. Devia ter permitido que eles andassem com os dedos miudinhos entrelaçados pelas ruas e avenidas.Mas ele crescia e ao passo que crescia se sentia mais independente e queria andar correndo pelas ruas, também não queria que os amigos o vissem e zombassem dele. Talvez não tivesse se importado com isso se soubesse que as mães morriam.

Suas lágrimas que desciam leves se tornaram fortes torrentes d'agua acompanhadas de soluços compulsivos incontroláveis. Já não suportava mais a dor que havia dentro de si e correu, correu e só parou em seu quarto. Bateu a porta e jogou-se na cama. Culpou Deus, culpou a vida e culpou a si mesmo. Devia ter lhe dado amor.

Logo sentiu um calafrio tomar todo o seu corpo, uma sensação estranha de que alguém o observava. Seguido do calafrio, o medo também o possuiu. Estava com a cabeça enterrada no travesseiro, paralisado. Se perguntava que sensação era aquela, podia sentir uma presença atrás de si, mas não tinha coragem de virar e verificar se suas suspeitas tinham fundamentos. A sensação de ser observado estava paralisando-o. Aos poucos foi virando a sua cabeça para ver o que estava observando-o. O choque não permitiu que ele fugisse ou gritasse. Sua mãe estava parado ali, diante dele. Um espectro. O espectro reproduzia a mais bela imagem de sua mãe que ele conservava na memória. Ela estava em um belo vestido de festa muito colorido, batom vermelho na boca, brinco enormes e dourados, a pele rosa e os cabelos soltos. Aos poucos foi se sentindo tranquilo ao lado daquele fantasma. Lentamente o medo foi passando e dando lugar a uma sensação de conforto. Com alguma dificuldade perguntou:

- Ma- mãe?

- Meu filho...

Ao escutar a sua voz todo seu corpo estremeceu. Não podia ser fruto da sua imaginação, era demasiadamente real. Olhou para trás, esperou, virou-se novamente para frente. O fantasma permanecia parado na sua frente. Olhou-a fixamente depois abaixou a cabeça em sinal de resignação, como se fosse uma espécie de santa

- Perdoa, mãe?

- Perdoar o que, meu querido?

- Não te amei da maneira que você merecia.

- Você me amou, meu filho. Em silêncio, mas eu podia sentir.

- Mãe, você merecia flores e palavras bonitas.

Na cama Leo se retorcia, se debatia entre os lençóis. Mexia os braços, as pernas, virava para um lado, virava para o outro. Os olhos queriam abrir, mas não conseguiam. Quando finalmente acordou estava com a camisa encharcada de suor. Arfava, sem fôlego. Tateou a parede até conseguir ligar a luz. Não havia ninguém dentro do seu quarto.Sentou na cama sentiu medo. Levantou e vagarosamente seguiu pelo corredor e parou diante da porta do quarto dos seus pais. Ficou um momento em silêncio refletindo. Com bastante cuidado abriu a porta do quarto e seguiu na ponta dos pés até o lado da cama em que sua mãe estava dormindo. Escutou a respiração dela, deu um beijo de leve em sua face, sussurrou em seu ouvido que a amava e seguiu para o seu quarto.

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